José Martins Gonçalves

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19 janeiro de 1940
84 anos

O José, aquando do falecimento do tio José Daniel (1980) deixou a casa, deste e da tia Maria, onde trabalhava, e veio para casa dos meus pais (Arménio e Maria). 

É em 1981 que, na procura da sua origem, dado não ter nenhuma documentação, embora ele dissesse que era da Miuzela, que fui tentar descobrir, contando o pouco que sabia, ao então pároco da Miuzela, já com uma belíssima idade. E, eis que se lembrava da situação, tinha sido ele a batizá-lo, mas, em Badamalos…

Fomos a Badamalos e, lá estava o registo de batismo, que abriu portas, a que o José fosse, comprovadamente, cidadão de direito, neste país, ainda perfumado com o cheiro dos cravos de abril de 1974. Os pais tinham-no, de alguma forma, abandonado e, após uma breve passagem por Alfarazes, a Aldeia do Bispo passou a ser a sua casa… 


Falar do José, será sempre falar dum pastor. Não sabemos muito bem o que é esta profissão nos dias que correm (?) porém, nos tempos em que o José foi pastor e, foi-o até pouco depois do meu pai falecer (1999) ser pastor, era dar, em pleno, 365 dias (e algumas noites…) aos animais (no caso, cabras). Quando não era na solidão do pastoreio, acompanhado do som dos chocalhos, do vento e do muito frio ou calor, era no corte das ramas, das ervas e afins, para as alimentar. 

Muito cansativo seria… porque as cabras que o José pastoreava, quando iam para o vale (Mata) tinham os pelos do lombo arrancados, dado que, nos regressos, na subida, o José agarrava-se aos pelos, na tentativa duma ajuda. 

Porém, o trabalho não acabava nessa atividade. O José, foi sempre, nas duas casas, quem estava ali, para ajudar no que fosse necessário, mesmo que muitas vezes inábil (quem sabe se intencionalmente, na convicção que se livraria duma atividade...) Nos tempos em que éramos muitas crianças, nas brincadeiras da aldeia, víamo-lo, ao fim das tardes de verão, a carregar cântaros de água entre o chafariz e a talha da água que o tio José Daniel tinha em casa…era ele, quem partia as gestas verdes, e separava, as pontas para a cama dos animais, e os toros partidos haviam de fazer muito fumo, na lareira, importante, para secar o fumeiro. 

O José adora festas. Quem não o recorda, na festa da Santa Cruz, com a sua boina, sempre ao lado da banda, de preferência junto ao maestro. Ainda estou a ver a sua imensa satisfação, numa das vezes que fui mordomo, com as minhas irmãs e lhe disse, que, ele também era mordomo. Gosta, muito, de festas de anos. Sem saber ler, escrever e/ou contar, atrevam-se a perguntar-lhe os aniversários dos filhos, netos e bisnetos do Arménio e Maria, sabe todos. 


Tem métodos de aprendizagem fantásticos. Um belo fim de semana foi comigo a Lisboa, ao fim do dia pois claro…e era um perguntar contínuo, de que localidade se tratava, sempre que via luz. Muitas localidades eram áreas de serviço… Quando passamos Vila Franca de Xira, fui eu que me antecipei e lhe disse o nome. Eis senão, quando no regresso, ao fim da tarde, mas ainda de dia, quando estávamos a passar Vila Franca de Xira, ele pergunta… Aires já estamos em VFX!... 

A minha mãe dizia, que o José era chato… e seria. Em particular depois de, com a morte do meu pai, não ter as suas cabras…para conversar. Também a minha mãe havia de vir a falecer (2018), e, o José, que já estava no Centro de Dia de Aldeia do Bispo, ainda viveu, pouco tempo, sozinho. Uns anos antes tinha colocado uma prótese na anca e, foi o Lar de Peva, que o recebeu e cuidou na convalescença.


É essa a casa do José, atualmente, sem antes, não deixar de dizer à Filomena porque não manda a sua mãe para um lar? E, referir que…nos lares, só se morre (?...) Todos sabemos que o José é amigo, e, uma pessoa simples. Estava a minha mãe convalescente no hospital, numa visita, quando deixamos o quarto, para o André e o José entrarem, o André ria-se perdidamente. Na indecisão de se decidir para onde o José iria, tentámos discipliná-lo e responsabilizá-lo na utilização, autónoma, do seu espaço (que seria sempre uma tarefa complicada) e eu disse-lhe que iria comprar-lhe uma televisão…afinal o André ria-se, porque o José lhe terá dito que, ele, só queria, mesmo, um rádio de bolso, a pilhas!...

Escrito por Aires Almeida, dezembro de 2024.

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